quarta-feira, 6 de março de 2013

Diário de Bordo - Dias 4 e 5

Montemor-o-Novo - Arraiolos

Assim que nos deitámos, entrámos no mundo dos sonhos. Estávamos preparados para, a qualquer momento, saltar da cama com a buzina dos bombeiros caso houvesse alguma emergência mas, a única coisa que nos acordou, foi o nosso despertador às 8 horas. Estávamos exaustos, ficámos na ronha um bom bocado mas lá teve que ser. Higiene feita e roupa vestida, bora lá para a tarefa diária de colocar tudo na Abília - 45 minutos! Comemos qualquer coisa e fomos agradecer ao Comandante, extremamente amável, por todo o apoio que nos deram. O sol brilhava, mas o céu estava a escurecer e, como já estávamos “escaldados”, vestimos os impermeáveis e seguimos viagem, isto às 10.30h.
Ainda estávamos doridos do dia anterior e durante o caminho, já a chover, começámos a fraquejar e tivemos que parar a meio do caminho. Sentámo-nos no chão, colocámos o toldo por cima de nós e, comendo uma maçã, olhámos para o Além e pensámos (desesperando) “Quando é que esta M**** de tempo vai passar?!”... Ficámos ali um bom bocado, a chuva abrandou, parou e começou novamente... Bem, vamos lá!
Esquerda, direita, esquerda, direita... O Tiago pára. “Já não aguento mais! Fiquei sem forças.”
Doía-lhe imenso os braços, a Abília estava muito instável e exigia muita força de braços para a controlar e o vento não ajudava em nada. Sentámo-nos novamente, desta vez sem chuva. Foi o primeiro momento de desespero, o primeiro teste, a primeira resistência. A Telma não esperava aquela reacção do Tiago, ficou quase como paralisada mas percebeu que tinha que agir. Abraçou-o, tentou, com calma, fazer-lhe ver que desistir era a última coisa a pensar. Depois de uma boa e longa conversa, os ânimos voltaram e apareceram soluções mais lógicas como, revermos o que temos e tirar a carga que poderá estar a mais e que seja dispensável.
Voltámos a pedalar e, a 7km de Arraiolos, avistámos uma estação de serviço que ouvimos a chamar por nós! Parámos, estacionámos a Abília e fomos comprar um gelado para nos alegrar o dia e acomodar o estômago com um pouco de açúcar. Ficámos na esplanada (com toldo) a olhar para a chuva a cair sem dó e começámos a fazer uma lista mental do material que podíamos tirar. Entretanto, dois caçadores saem do café e...

- Bah! Acho que deixei uma fresta da janela aberta! O meu banco deve estar todo molhado! - Disse um deles.
- Já nós não temos esse problema, o nosso é descapotável. - Disse o Tiago, rindo e apontado para a Abília.
- Então? Vocês estão a andar de mota com este tempo?!! - Exclamou o caçador.
- Não, é mesmo uma bicicleta! - Dissemos quase em coro.
- Ai! E vão os dois ali? Que loucura! Vão pra longe?
- Para a Noruega!
- Meu Deus!!! Isto é que é aproveitar a vida! Muito bem! Gabo-vos a coragem! Força han! - Disse enquanto saía.

Quando a chuva passou, retomámos caminho, muito mais animados e com mais energia. Víamos uma subida (foram bastantes!) e riamos dela, desfrutámos ao máximo das descidas (uma delas a 55km/h) e tirámos algumas fotografias. Quando estávamos a chegar, começou a chover e procurámos um abrigo, mandámos mensagem à rapariga de Couchsurfing que estava à nossa espera e disse-nos que morava ao pé dos Bombeiros, que já tínhamos visto que estávamos perto, então subimos uma rua e chegámos em menos de 5 minutos. Conhecemos a Patrícia, colocámos a Abília na garagem, levámos as malas para o “nosso” quarto e respirámos fundo! Finalmente debaixo de tecto! Conversámos um pouco com a Patrícia para nos conhecermos melhor, percebemos logo desde inicio que era uma excelente pessoa, muito simpática, mente aberta e gosta de conhecer e descobrir. Ela tinha que sair e deixou-nos a chave caso quiséssemos passear, despimos os impermeáveis molhados, calçámos as botas secas e fomos passear por Arraiolos. É uma terra muito bonita, tradicional e catita. Fomos ao supermercado comprar o belo do pão alentejano e algo para beber e seguimos para o castelo que estava no topo da cidade. Ao subir as escadas até lá, íamos apreciando a vista magnifica da zona, escolhemos um sitio para lanchar, sentámonos e, quando estávamos a deliciar-nos, começa a chover! Vá de correr, nada de abrigos, restou-nos a entrada em pedra do castelo. Passada uma hora, a chuva parou e lá fomos a passos largos até casa, onde tomámos um banho quente.
Quando a Patrícia chegou, preparou um jantar vegetariano, um género de legumes salteados e cogumelos (gourmet!) com couscous que estava maravilhoso.
Conversámos tanto, que nem demos pelo tempo passar. Vimos o tempo para o dia seguinte e ia chover a potes e fazer muito vento, também precisávamos de descansar e ganhar forças para voltar a pedalar então pedimos à Patrícia para ficar mais um dia e a resposta foi instantânea e afirmativa. Quando olhámos para o relógio percebemos que já passava da meia noite e era hora de dormir, chegámos ao quarto e tínhamos dezenas de chamadas perdidas dos nossos familiares! Já estavam em pânico e a fazer filmes dignos de um Óscar. Depois de os tranquilizarmos, fechámos os olhos e Puf!
Foi um dia intenso, já nos tinham avisado que este tipo de descaídas iam acontecer e que tínhamos que nos apoiar mutuamente e confirmamos! Hoje foi o Tiago, um dia será a Telma. Definitivamente, nenhum de nós faria esta viagem sozinho, deixava de fazer sentido, não teríamos um ombro para chorar nos maus momentos, um corpo para abraçar quando estivéssemos radiantes, uma mão para agarrar quando o medo chegasse e, sobretudo, não teríamos alguém com quem partilhar a beleza do que vamos conhecer. Se fosse só um de nós, no regresso contaria tudo o que passou mas a emoção era só dele e não de ambos.

“Era um castelo mesmo no pico da montanha, com um muro em pedra a fazer um circulo. ‘Tás a ver?”
“Não, não estou, Não estava lá.”

Assim, choramos, rimos, desesperamos e vivemos tudo o que há a viver juntos!

Hoje, quarta-feira, ficámos por Arraiolos e nem saímos de casa. Descanso absoluto! Tem estado frio, vento e chuva e, felizmente, temos apreciado tudo isso pela janela! Temos os ténis a secar e vamos tirar o peso a mais.
Já tivemos um lanchinho com a Patrícia, um chá de doce-lima, compotas caseiras e uns biscoitos de Alfarroba e outros de azeite, Espelta e ervas-doces.
Logo, comemos uma sopa quentinha e vamos dormir para amanhã acordarmos cheios de energia para levar com chuva em cima!


Podem ver as fotografias, aqui


1 comentário:

  1. Comecei a acompanhar-vos e senti um "déjà vue"!
    Força para a aventura!
    Mónica (mãe dos Nomadiclas)

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